Fabrício Queiroz e ex-assessores de Flávio Bolsonaro são alvo de operação no Rio
Queiroz é pivô de uma investigação que tem como alvo o próprio senador e outras 101 pessoas físicas e jurídicas, que tiveram os sigilos bancário e fiscal quebrados
O policial militar aposentado Fabrício Queiroz, ex-assessor do
senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ), é alvo de operação comandada pelo
Ministério Público do Rio de Janeiro. Agentes estão em endereços de Queiroz no
Rio de Janeiro e de outros ex-assessores do senador. Entre eles, parentes de
Ana Cristina Valle, ex-mulher do presidente Jair Bolsonaro.
Entre os 24 alvos da operação que apura suposta
lavagem de dinheiro estão parentes de Ana Cristina Valle, ex-mulher do
presidente Jair Bolsonaro, alguns que moram em Resende (RJ). Já foram
recolhidos documentos e celulares na casa de alguns dos alvos. O Ministério
Público ainda não se pronunciou sobre a operação, alegando que o procedimento
corre sob sigilo.
As buscas e apreensões ocorrem após quase dois anos
do início das investigações contra o PM aposentado. A Promotoria fluminense
recebeu em janeiro de 2018 o relatório do Coaf (Conselho de Controle das
Atividades Financeiras) apontando movimentações atípicas de Queiroz.
No caso
de Flávio, o alvo de busca e apreensão foi a loja de chocolates do senador. Os
agentes chegaram por volta das 6h40 ao shopping Via Parque, na Barra da Tijuca
(zona oeste), onde fica a franquia da Kopenhaguen do senador, e deixaram o
local por volta das 10h40.
Flávio é
dono de 50% da franquia desde janeiro de 2015. A firma é citada num relatório
do Coaf que descreve oito transferências que somam R$ 120 mil dela para o
senador entre agosto de 2017 e janeiro de 2018. A empresa também foi alvo de
quebra de sigilo bancário e fiscal pela Justiça em abril.
A defesa
de Flávio ainda não se manifestou. Já a da família de Queiroz afirmou que
recebe a ação "com tranquilidade e, ao mesmo tempo surpresa, pois é
absolutamente desnecessária". "Ele sempre colaborou com as
investigações, já tendo, inclusive, apresentado todos os esclarecimentos a
respeito dos fatos", disse o advogado Paulo Klein.
"Ademais,
surpreende que o mesmo MP reconhecendo que o Juízo de Primeira instância seria
incompetente para processar e julgar qualquer pedido relacionado ao ex-deputado
o tenha feito e obtido a referida decisão", disse o advogado.
Ele se refere ao posicionamento da procuradora Soraya Gaya, que atua na 2ª
Câmara Criminal, que foi favorável à concessão de foro privilegiado ao senador
em habeas corpus protocolado por Flávio. A defesa desistiu depois do pedido.
Queiroz é pivô de uma investigação que tem como alvo o próprio senador e outras
101 pessoas físicas e jurídicas, que tiveram os sigilos bancário e fiscal
quebrados. A Promotoria suspeita de um esquema conhecido como
"rachadinha" no gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio
de Janeiro (Alerj) no período em que foi deputado estadual e manteve Queiroz
como seu empregado (2007/2018).
A prática consiste em coagir servidores a devolver parte do salário para os
deputados. Estão sendo investigados crimes de peculato, lavagem de dinheiro,
ocultação de patrimônio e organização criminosa. Mensagens reveladas pela Folha
de São Paulo em outubro já mostravam a preocupação de Queiroz com as
investigações. Em áudios de WhatsApp, ele descrevia o caso como um problema
"do tamanho de um cometa" e se queixava de falta de proteção.
"Eu não vejo ninguém mover nada para tentar me ajudar aí. Ver e tal... É
só porrada. O MP [Ministério Público] tá com uma pica do tamanho de um cometa
para enterrar na gente. Não vi ninguém agir", disse o PM aposentado em
áudio de julho deste ano. Os áudios foram enviados por Queiroz a um
interlocutor não identificado, por meio do WhatsApp. A fonte que repassou as
gravações à reportagem pediu para não ter o nome revelado.
A
apuração sobre Flávio começou em janeiro de 2018 quando o Coaf (Conselho de
Controle das Atividades Financeiras) enviou espontaneamente um relatório
indicando movimentação financeira atípica de Queiroz de R$ 1,2 milhão entre
janeiro de 2016 e janeiro de 2017.
Além do
volume movimentado, chamou a atenção a forma com que as operações se davam:
depósitos e saques em dinheiro vivo em datas próximas do pagamento de
servidores da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
Queiroz
afirmou que recebia parte dos valores dos salários dos colegas de gabinete. Ele
diz que usava esse dinheiro para remunerar assessores informais de Flávio, sem
o conhecimento do então deputado. A sua defesa, contudo, nunca apontou os
beneficiários finais dos valores.
Flávio,
por sua vez, afirmava que quem devia explicações sobre a movimentação
financeira era seu ex-assessor. Desde que o caso foi revelado, Queiroz teve
raras aparições públicas. De acordo com sua defesa, ele está em São Paulo desde
dezembro do ano passado para o tratamento de um câncer.
A apuração ficou pouco mais de quatro meses interrompida por liminar do
ministro Dias Toffoli, do STF, alegando que o Coaf não poderia compartilhar
dados detalhados das movimentações bancárias -tese que foi derrotada no plenário
no início do mês.
Embora
estivesse empregado no gabinete de Flávio entre 2007 e 2018, a origem da
relação de Queiroz com a família Bolsonaro é o presidente da República. Os dois
se conhecem desde 1984 e pescavam juntos em Angra dos Reis. O PM aposentado
também depositou R$ 24 mil na conta da primeira-dama Michelle Bolsonaro em
2016. O presidente afirma se tratar de parte da quitação de um empréstimo de R$
40 mil.
Em
setembro, o Ministério Público do Rio abriu um terceiro inquérito para
investigar denúncias de irregularidades no gabinete de Flávio.
O objetivo é "apurar eventual improbidade administrativa decorrente do
emprego de 'assessores fantasmas', isto é, pessoas investidas em cargo em
comissão junto ao gabinete do então deputado estadual que não teriam exercido
funções inerentes à atividade parlamentar".
Já existe
um inquérito civil no MP-RJ para investigar uma eventual prática de improbidade
administrativa no gabinete de Flávio -mas, nesse caso, sobre a devolução de
parte dos salários de funcionários ao gabinete, ato conhecido como
"rachadinha".
Agora, segundo o Ministério Público, o objeto desse terceiro procedimento não é
apurar a devolução de salários por funcionários, apenas se exerciam suas
funções.
Queiroz também passou a ser uma dor de cabeça para a família presidencial para
além da questão financeira. Foi o PM aposentado quem indicou duas parentes do
ex-capitão Adriano da Nóbrega para ocupar cargos no gabinete de Flávio na
Alerj. O ex-PM é acusado de comandar uma das milícias mais violentas da cidade
e é considerado foragido há quase um ano.
ALVOS:
Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro
Márcia Oliveira de Aguiar, mulher
do ex-assessor
Evelyn Queiroz, filha do
ex-assessor
José Procópio Valle, ex-sogro de
Bolsonaro
Andrea Siqueira Valle, ex-cunhada
de Bolsonaro
Francisco Diniz, primo de Ana
Cristina
Daniela Gomes, prima de Ana
Cristina
Juliana Vargas, prima de Ana
Cristina
Maria José de Siqueira e Silva,
tia de Ana Cristina
Marina Siqueira Diniz, tia de Ana
Cristina
Guilherme dos Santos Hudson, tio de Ana Cristina
Ana Maria Siqueira Hudson, tia de Ana Cristina